* Coluna publicada no Diário do Meio Oeste do dia 21 de abril de 2012. Confesso que fez-me chorar enquanto imaginava e escrevi. **
Ouvindo: Cum On Feel
The Noise do Quiet Riot.
Queria
ter uma mente tão boa para poder lembrar de quais os primeiros gestos ou
atitudes que tive quando bebê. Tenho poucas fotos. Naquele tempo não existiam
máquinas digitais e imprimir fotos não era tão barato quanto hoje. Eram as
máquinas de filme mesmo. Havia de se adquirir os filmes e depois mandar revelar. Lembro de uma cena em que eu era fofo. Fofo
no sentido metafórico de gente pequena, bebê.
Mas
apenas naquele tempo. Hoje ando fofo de gordo. Deve ser por influência da
indústria de animais: engorda para abater mais tarde. Mas meu bacon deve ser bem
bom. Slápt! É como comida: quanto mais gordurosa parece que é melhor. Mas
voltando ao fofo. Tem uma cena que estou de fralda (aquelas de pano ainda com
uma cueca elástica para segurar) e com um conjuntinho colorido.
Nem
sei quem fotografou. Minha mãe não foi, tampouco meu pai. Um tio ou tia quem
sabe. Independente de quem, pegou nossa posição e marcou nossa história. Tanto
a minha quanto a história das demais pessoas. Lembro de minha irmã mais velha;
uma menininha naquela foto e ,hoje, um mulherão. O tempo passa e as lembranças
também. Poderiam não passar; que ficassem as lembranças que esquecemos. Aquelas
boas.
Aquele
conjuntinho colorido que sumiu. Deve ter servido para outra criança. Até por que
ficar guardando toda roupa de criança não é bom. Bom mesmo é repassar; fazer
andar. Não tudo, mas as úteis. Roupa é
um produto que tem vida útil; usa-se e joga-se fora. Antes de jogá-la no lixo,
que permita outra criança usar. E tem muitas crianças que fariam bom uso. Tão
útil e simpático o compartilhar, o doar, o ajudar.
O
velho conjuntinho lembrou-me do que esqueci, ou melhor, do que não lembro.
Quiçá permaneça em algum local muito bem escondido do cérebro. Quão bom seria
se fosse com controle remoto (daqueles em que a pilha nunca acaba e poderia ser
levado para qualquer local, sem atrapalhar): apertar o botão ”retroceder” e
visualizar alguma cena não lembrada ou
digitar no botão “pesquisar”.
Redundante,
mas o tempo passa a cada instante. Não nos dá a oportunidade de parar e dizer:
- Espere aqui até eu decidir seguir. Não temos esta tecla, tampouco controle
remoto. Como uma ficção, poderiam apontar que parar o tempo resultaria em
estragos para outros também. Imagina se todos decidissem parar o relógio:
ninguém seguiria. Precisamos caminhar
para frente, pois neste assunto não tem o contrário.
Supondo
que Nosso Criador oportunizasse apenas um “pause” na vida. Você teria de pensar
com racionalidade e instantaneidade: em qual momento você apertaria o “pause”
da vida? Ou para quem você apertaria o “pause” da vida? Poderia ser um momento
bom, ruim feliz, alegre, emocionante, confuso, complicado. Difícil. Muito
difícil escolher o momento certo para apertar aquele botão.
Passei
a semana pensando nisso. Quis compartilhar um momento de reflexão com você. Lembrei do meu velho pai; mas não apertaria o
“pause”. Ele teve o tempo dele. Tem minha mãe que merece muito este “pause”. Uma
vitória, uma conquista, um acidente, uma notícia. O meu “pause” eu sei e faria
agora: ficar admirando a minha pequena filha sorrir. Este gesto merece um
“pause” infinito, como o meu amor por ela.
Ouvindo: Heroes do
David Bowie.