sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Uma longa amizade


Ouvindo: Bohemian Rhapsody do Queen.

            Já sei qual seria minha maior frustração como um pai rocker. Mas tenho de tentar (sabendo que não conseguirei, tampouco farei esforço para isso) lidar com o que vier. Podem levar tudo embora, mas deixem meus grandes amigos por perto. São os únicos que estão sempre ali, perto, junto nos melhores e piores momentos. Várias foram as oportunidades em que recorri aos seus encantos e palavras para me serenar a alma.
            As vozes que ouvia em meu silêncio faziam-me rejuvenescer o espírito, quebrantar a mágoa, dividir a alegria e sorrir para o dia. Ainda não houve um gesto que me fizesse sentir a calmaria de um momento com meus amigos. Conheci-os muito cedo e ainda hoje preservo esta amizade, este pacto vital. Não me obrigaram a escolhas, pois não as me deram, muito menos as procurei.  

            O mundo oferece, todos os dias, oportunidade de conhecer outros amigos, mas recolhi-me aos meus velhos e inseparáveis companheiros de vida. Não os poderia trair. Trair esta confiança arrebataria oportunidades em que não quero vivenciar. O pouco que sou obrigado a suportar já extrapolou o sensato. Sabiam eles, antes mesmo de eu chegar ao mundo, que seria um amigo fiel e que poderiam contar com meu suporte.

            Alguns morreram nestes tempos. Nunca os lugares foram ocupados por outros. As cadeiras da mesa permanecerão vazias, como homenagem aos que foram; jamais serão esquecidos. A cada rodada são reverenciados, como revolucionários e como amigos. São aqueles que carregaram as mágoas e alegrias; nunca pediram nada. As palavras se fizeram verdadeiras ferramentas de inspiração.

            Alguns motivos da minha existência mudaram, mas nunca os amigos foram deixados de lado. Alguns entram e outros saem do trem. Os caminhos, em alguns casos, nunca mais se cruzarão. Contudo, meus velhos amigos sempre sabem onde estou e eu sei de onde eles estão. O velho lugar na mesa segue vago. Não para ser ocupado por outro, mas para se estender uma nova cadeira à mesa.

            Jamais ouvi um adeus. Apenas acenam e sinto o até logo. Eis que nunca os esqueço, tampouco eles. O abandono não é uma expressão conhecida ou praticada neste nosso relacionamento. De certa forma (e de forma certa) somos extremamente ciumentos. Sentimos que não podemos deixar outros intrusos invadir nosso espaço. Não que não podem acenar e dizer “hello”, mas não sentar à mesa.

            O círculo é fechado e a porta são poucos que a chave têm. O pacto é duradouro e rígido, tal qual o zircônio - um metal duro e muito resistente a corrosão. Dificilmente consegue ser corroído; corrompido. O laço estreito entre os integrantes desta mesa é muito estreito e próximo, profícuo. Nossa amizade perdura além-vida. Não é em uma vida que nos esquecemos dos que já partiram.

            A lembrança fica a cada nova rodada pedida ao garçom do bar. As cadeiras continuam vazias, mas com suas lembranças por todos os demais. Frustrado seria ter de dividir esta mesma mesa com a do lado. Frustrado seria eu em querer quem uma pessoa estivesse ao meu lado, na cadeira que já reservei, mas optar pela mesa colorida e sem amigos, insossa, ao lado. Vida longa do Rock And Roll!

Ouvindo: Now You´re Gone do Whitesnake. 

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

O buraco do teto


** Coluna publicada no Jornal Diário do Meio Oeste - edição do dia 07 de julho de 2012.**

Ouvindo: Bon Jour do Salvador Domínguez.

Já deve ter escutado, ou lido, a expressão epifania. Descobrir o significado já vem junto de outras descobertas na vida. Quem sabe seria a localização da telha que faltava para cobrir o telhado. Aquele velho buraco, por menor que fosse, sempre era motivo de o fazer pensar em como cobrir. Cobria-o com um pedaço de madeira; não ficava bom. De fora, via-se que destoava das demais peças. Cobria com lona, mas também não gerava o sentimento de pertencimento.

Passamos anos após anos procurando, consciente ou inconscientemente, a tal da peça que falta. Alguns descobrem, outros morrem com esta lacuna. Esta telha pode ser uma pessoa, um trabalho, uma obra, o plantio de uma árvore, a publicação de um livro ou filme, o salvamento de uma pessoa, um beijo na mão do Papa, assistir o show do seu ídolo. A tal da telha pode ser encontrada no momento em que menos se espera. Pode morrer a procurar, sem encontrar. Não se busca, eis que a telha surge.

Ouvi, algum dia, a história do pequeno gato. O gato-pai olhava o filhote e analisava-o correndo atrás do rabo. Quem já viu isso em gato ou cachorro, sabe. Fica girando e girando até cansar. Até que cansou e o gato-pai disse não ser necessário correr atrás, pois, quando se percebe, ele está sempre junto. Aliás, e bem perto. Alguns passam a vida correndo atrás e não localizam a telha que falta. Outros, sem procurar, descobrem a telha da cobertura.

E esta epifania veio depois de um momento de silêncio. A própria voz que me afastou, trouxe-me de volta. Tive de rastejar nos mais perversos sentimentos impregnados no meu íntimo para poder ter a claridade suficiente de olhar o restante do que continha e não apenas os resquícios do passado. Ao que acendeu a luz do corredor, não o conheço. Pode soar esquizofrenia, mas sempre há outro dentro de cada um. No momento da inópia, algo eclode do inconsciente.

Eis que o silenciar se tornou necessário para que a voz pudesse ser ouvida. Aliás, a voz não falou, ela obrigou a deixar a penúria de um estado. Foi um comando necessário para suprimir algumas telhas imperfeitas e recolocar as novas. O quebrantado foi substituído. Com a novidade, eis que outras vozes se apresentaram, indicando caminhos. Não houve a possibilidade de dois ou três caminhos, traçar dois ou mais ao mesmo tempo. É regra da Física: não podem dois corpos ocupar o mesmo lugar.

A escolha do caminho, mesmo sem o conhecer, literalmente, foi traçado mais com o sentimento de aventura (e guiado por placas de sinalização). Para confessar, com a informação de um que outro frentista de posto. Mas estas passagens foram necessárias para que a telha surgisse mais adiante. Como nas lojas que vendem azulejos em desuso, não tão comuns na região Sul do Brasil, mas que são muito úteis. O preço é caro, mas a necessidade de localizar uma peça única o faz valer a pena no contexto final.


A metáfora da telha pode ser usada por variadas formas ou até concepções. Depende da sensibilidade. Esta telha por ser qualquer coisa - mas qualquer mesmo. A minha telha tem nome, sobrenome, um cabelinho tipo pêssego cheiroso, e a voz mais gostosa de se escutar no mundo. Foi esta voz que me fez acordar diante das minhas profundezas, a minha epifania. Sei que aos poucos vai tomando forma, os sons vão se assemelhando aos nossos, mas, com justiça, superou a Chrissie Hynde.

Ouvindo: Something To Believe In do The Pretenders.   


PS: Acima, a minha telha que faltava.

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

O sol sempre brilhará


** Coluna publicada no Diário do Meio Oeste do dia 15 de setembro. **

Por Iaran de Oliveira


Ouvindo: Sun do John Lydon.

Desde que os nossos antecessores (muitos deles vivos) decidiram que o Brasil teria o Presidencialismo como Sistema de Governo, através do Referendo de 1963, queriam que a democracia fosse levada a cabo, ou seja, que o cidadão pudesse escolher, de forma livre, os seus representantes legítimos. Em outubro próximo, exatamente no dia 7,  iremos às urnas para o exercício de um poder que só nós, cidadãos eleitores, temos: o de votar.
A Democracia não pode ser entendida apenas como o direito de votar em que preferir, mas sim, ter a oportunidade de participar, opinar, sugerir, torcer, vibrar, desejar, querer e fazer. Contudo, isso tudo de forma livre, sem prejudicar este ou aquele. No artigo 3º da nossa Constituição Federal(CF) está escrito: “I - construir uma sociedade livre, justa e solidária”. A expressão livre, contudo, seguindo o próprio entendimento jurídico, não é absoluta ou o “fazer o que quiser”.
Estamos em dias tensos, quentes. Afloram nos cidadãos os anseios pela vitória (ninguém gosta de perder) de um determinado partido ou candidato. Porém, como ocorre a cada dois anos (oscila entre escolha de prefeitos e , depois, presidente e governadores) as eleições ocorrem; E PASSAM. Este período de campanha é passageiro, tal qual o pleito. Todo campeonato tem início, meio e almeja o final (poucos os que pararam no meio do caminho). Iniciam e terminam.


O que isso quer dizer? Quero dizer que as eleições passam. Mas a eleição não deve ser motivo de guerra, de briga, de criar inimizades, travar debates homéricos em mesa de bar, brigar com o vizinho, atravessar a rua motivado por tal candidato no mesmo caminho. Deve ser um momento para analisar, pensar, refletir, planejar o nosso (teu e meu) futuro.  É momento de avaliarmos bem quem queremos que nos represente. Isso é o que se pretendeu quando definiram nosso Sistema de Governo.

As eleições passam, mas as pessoas ficam. Estar no poder é passageiro. É por um período.  Há a possibilidade de seguir sim; com nova opção do eleitor. O pleito passa, os gestores passam, mas as pessoas ficam. As p-e-s-s-o-a-s! E é isso que deve prevalecer: a pessoa, o ser humano. Não podemos privilegiar a discórdia, a briga, a insensatez, a raiva, a inimizade. Devemos lembrar que este tempo passa, tal qual um temporal. Os políticos vem e vão, mas as pessoas ficam.
Quando nosso time é derrotado pelo time do amigo não é motivo de briga. Do contrário, durante o jogo torcemos, conversamos, vaiamos, comemoramos e, no final, saímos abraçados. A vida prossegue. O jogo acaba, mas as pessoas continuam. Nós seguimos. No próximo, quem sabe, seja o momento de nós vencermos, do amigo rir e o ciclo continua. Não podemos deixar que esta Democracia, a liberdade de escolha, possa interferir na nossa relação de amizade.
Estamos em período eleitoral, mas para decidir nosso futuro. Não estamos em uma guerra, lutando pela vida. O que quero exprimir é que as pessoas não devem criar inimizades apenas por convicções políticas. Cada um decida, opte, escolha, defina. Não se pode deixar que integrantes equipes distintas deixem de se olhar, de se falar, de se cumprimentar em razão de uma escolha. Mesmo que de times diferentes, o desejo é que a Democracia prevaleça; o sol nascerá novamente amanhã.
Não quero ensinar a minha filha a virar o rosto para um colega, pelo simples fato de o pai ou mãe gostar de sertanejo ou de pagode, ou de bandinha, ou de eletrônico. Não gosto, é fato, mas isso não pode interferir na relação entre os dois. Quero que ela seja livre, respeite o colega. Que respeite o colega pela opção que ele ou seus pais fizeram. De verdade, quero caminhar no dia 8 e cumprimentar aquele que me excluiu do Facebook, voltar a apertar sua mão; sorver uma chávena de café juntos. Viveremos!

Ouvindo: Sunday Bloody Sunday do U2.