** Coluna publicada no Jornal Diário do Meio Oeste - edição do dia 07 de julho de 2012.**
Ouvindo: Bon Jour do
Salvador Domínguez.
Já
deve ter escutado, ou lido, a expressão epifania. Descobrir o significado já
vem junto de outras descobertas na vida. Quem sabe seria a localização da telha
que faltava para cobrir o telhado. Aquele velho buraco, por menor que fosse,
sempre era motivo de o fazer pensar em como cobrir. Cobria-o com um pedaço de
madeira; não ficava bom. De fora, via-se que destoava das demais peças. Cobria
com lona, mas também não gerava o sentimento de pertencimento.
Passamos
anos após anos procurando, consciente ou inconscientemente, a tal da peça que
falta. Alguns descobrem, outros morrem com esta lacuna. Esta telha pode ser uma
pessoa, um trabalho, uma obra, o plantio de uma árvore, a publicação de um
livro ou filme, o salvamento de uma pessoa, um beijo na mão do Papa, assistir o
show do seu ídolo. A tal da telha pode ser encontrada no momento em que menos
se espera. Pode morrer a procurar, sem encontrar. Não se busca, eis que a telha
surge.
Ouvi,
algum dia, a história do pequeno gato. O gato-pai olhava o filhote e
analisava-o correndo atrás do rabo. Quem já viu isso em gato ou cachorro, sabe.
Fica girando e girando até cansar. Até que cansou e o gato-pai disse não ser
necessário correr atrás, pois, quando se percebe, ele está sempre junto. Aliás,
e bem perto. Alguns passam a vida correndo atrás e não localizam a telha que
falta. Outros, sem procurar, descobrem a telha da cobertura.
E
esta epifania veio depois de um momento de silêncio. A própria voz que me
afastou, trouxe-me de volta. Tive de rastejar nos mais perversos sentimentos impregnados
no meu íntimo para poder ter a claridade suficiente de olhar o restante do que
continha e não apenas os resquícios do passado. Ao que acendeu a luz do
corredor, não o conheço. Pode soar esquizofrenia, mas sempre há outro dentro de
cada um. No momento da inópia, algo eclode do inconsciente.
Eis
que o silenciar se tornou necessário para que a voz pudesse ser ouvida. Aliás,
a voz não falou, ela obrigou a deixar a penúria de um estado. Foi um comando
necessário para suprimir algumas telhas imperfeitas e recolocar as novas. O
quebrantado foi substituído. Com a novidade, eis que outras vozes se
apresentaram, indicando caminhos. Não houve a possibilidade de dois ou três
caminhos, traçar dois ou mais ao mesmo tempo. É regra da Física: não podem dois
corpos ocupar o mesmo lugar.
A
escolha do caminho, mesmo sem o conhecer, literalmente, foi traçado mais com o
sentimento de aventura (e guiado por placas de sinalização). Para confessar,
com a informação de um que outro frentista de posto. Mas estas passagens foram
necessárias para que a telha surgisse mais adiante. Como nas lojas que vendem
azulejos em desuso, não tão comuns na região Sul do Brasil, mas que são muito
úteis. O preço é caro, mas a necessidade de localizar uma peça única o faz
valer a pena no contexto final.
A
metáfora da telha pode ser usada por variadas formas ou até concepções. Depende
da sensibilidade. Esta telha por ser qualquer coisa - mas qualquer mesmo. A
minha telha tem nome, sobrenome, um cabelinho tipo pêssego cheiroso, e a voz
mais gostosa de se escutar no mundo. Foi esta voz que me fez acordar diante das
minhas profundezas, a minha epifania. Sei que aos poucos vai tomando forma, os
sons vão se assemelhando aos nossos, mas, com justiça, superou a Chrissie Hynde.
Ouvindo: Something To Believe In do The Pretenders.
PS: Acima, a minha telha que faltava.
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