segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Aquilo

OBS: Os últimos posts são referentes a coluna semanal que tenho no jornal Diário do Meio Oeste, Videira-SC, intitulada de Cult. Um momento que me foi concedido para colocar alguns pontos de vista. No fundo, transformou-se em um diário sobre a paternidade.





Ouvindo: Eyes On Fire do Blue Öyster Cult.

Ontem eu chorei. Não aquele choro desesperado, triste, de deixar as bochechas rosáceas, mas eu chorei. Nem senti as lágrimas escorrerem por minha face, mas chorei. Lacrimejei ao ponto de sentir meu coração arder, suar, gritar. As lágrimas atemorizaram meu coração ao ponto d´eu senti-lo bater tão intensamente quanto um choque estelar.
Por um breve momento eu congelei. Imóvel, vi uma vida inteira passar perante minha mente. Os flashes solitários e inequívocos soaram como uma turbina de avião em plena decolagem. Aquela ensurdecera batida no coração me fez despertar de um instante mágico, fantasioso e irrequieto.
Ouvi como nunca antes uma palpitação ardente, marcante e arrepiante. Não como assistir a um filme de suspense com um som potente, mas como algo interno, íntimo, silencioso. A imensidão do sangue nas veias parou por um momento, se entreolharam pensando o que ocorrera. Retomaram seu trabalho e fizeram-me despertar.
Da apreensão de uma penumbra surtiu a claridade estonteante. Daquele momento infindável, despertei. Cegou-me. Pousei a face sobre minhas mãos, suadas e quentes, e percebi que aquele instante passou. Volte! Volte! Volte! Tentei gritar com minha voz embargada, seca, apelativa, mas nenhuma resposta.
O silêncio se fez presente e os olhos foram obrigados a retornar ao ponto inicial. Queria que meus ouvidos compreendessem que som era aquele. Da rapidez daquele barulho, um ruído estranho, incompreensível, mas forte, rápido e constante; surreal. Não me acalente com suas mãos macias e voz doce. Queria é escutar novamente. Mais e mais.
Quero sentir em minhas mãos este trepidar de um vulcão, o calor que transcorre por dentro de cada canal. Quero sentir minhas mãos quentes e suadas, trêmulas pela ânsia de um pouco mais apenas. Um instante infindável somente. O instante que antes congelara, agora passa como um raio em noite de chuva forte. Rápido, formoso e perigoso.
Percebo, agora, os quão únicos e imponentes sãos momentos que vivemos. Cada um, independente do tempo que permaneça, anota em nossa vida, no livro de nossa biografia mental, a importância de termos vivido aquilo. Não existe definição racional sobre o “aquilo”. Não são palavras que o explicarão. São apenas, “aquilo”.
As lágrimas não significam, necessariamente, a tristeza de um momento de partida, de raiva, de despedida, de solidão. Representam, acima de tudo, o sentimento de um momento, de um instante. Este instante pode perdurar por milésimos de segundo ou por anos. Quero que permaneça por uma vida inteira.
Farei o impossível para sentir aquele estrondo por gerações, por vidas. Caso necessário, voltarei de onde for para ouvir “aquilo” novamente. Mudarei o rumo do meu mundo para escutar novamente, mais e mais, aquele barulho tão gostoso, apaixonante, ensurdecedor que foi o coração da minha filha.

Ouvindo: The Tower of Hope do Ayreon.

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